quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Fidelidade feminina



Peguei a conversa pela metade, mas não pude deixar de acompanhar até o final. Ninguém resiste a escutar uma mulher confidenciando um segredo a outra.

– Desde quando isso está acontecendo?

– Ainda não está acontecendo, mas vai acontecer em breve. É horrível ter que traí-lo, nunca me imaginei nessa situação. A gente sempre se deu tão bem. Mas sinto que chegou a hora do meu turning point.

– Você conheceu outro?

– Uma colega me apresentou. Fiquei fascinada. Tão solto, tão moderno.

– Procura resistir, Marilia! Afinal, você construiu uma relação sólida de... quanto tempo mesmo?

– Dezessete anos, acredita? E nunca olhei para o lado, sempre com ele, fiel como uma labradora. Hoje é meu melhor amigo. Muito além do que qualquer outra coisa.

– E você vai arriscar perder essa cumplicidade por causa de uma tentação?

– Rê, chega uma hora em que é preciso mudar. Eu vou fazer 50 anos. Olho todos os dias para o espelho e enxergo a mesma cara, a mesma falta de brilho. Estou envelhecendo sem arriscar nada, sem experimentar algo diferente, nunca. Me diz a verdade: você acha que ele irá suportar?

– Tá brincando! Você pretende contar a ele???

– Ele vai reparar, né? Lógico.

– Não precisa falar nada, mulher! Se você for discreta, ele não vai descobrir.

– Só se eu trocasse de cidade, Rê. Ele vai ficar sabendo no mesmo dia. Você sabe como as fofocas voam.

– Se você pretende fazer essa besteira mesmo, melhor pensar nas consequências. A não ser que ele seja muito bem resolvido.

– Quem é bem resolvido numa hora dessas? Ele vai querer me matar. Vai me chamar de traíra pra baixo. Vai se sentir um lixo de homem.

– Ai, Marilia. Pra que inventar moda a essa altura do campeonato? Claro que às vezes também fico a fim de experimentar uma novidade, quem não fica? Mas, por outro lado, é tão bom não precisar mentir, não ter que criar desculpas... Uma amiga minha fez essa bobagem e conseguiu ser perdoada porque garantiu que tinha acontecido uma vez só, e em Nova York! O cara engoliu, mas a relação está estremecida até hoje, nunca mais foi a mesma.

– Eu sei, eu sei, só que não aguento mais usar o mesmo corte há 17 anos. Estou decidida, Rê. Vou trocar de cabeleireiro. Se me arrepender, assumo as consequências. Não suporto mais ficar refém de uma situação que é cômoda, mas que não me revitaliza.

– Então só posso te desejar boa sorte, amiga. Vou te confessar uma coisa, mas não espalha: eu adoraria trocar minha manicure por outra novinha que recém entrou no salão. Me diz se tem cabimento isso. Já troquei de marido três vezes, e não tenho coragem de deixar a Suely.

Martha Medeiros

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