segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Sobre o que não é amor



O quanto você se violenta para se sentir amada?
Quantas vezes você se desrespeita porque precisa ser boa para as pessoas? Desmembra quem você é e oferece um pedaço para cada um porque isso é amor. 
É o que você aprendeu. 

Mas isso não é amor.
Isso é violência, é egoísmo, é nocivo. 

“Olha o que eu fiz por você, me ame de volta”
“Olha tudo que eu te dei, e você não me ofereceu nada”
“Deixei de fazer coisas, seguir sonhos porque isso é amizade/casamento/família”.

Faz sentido pra você? 
Te causa desconforto?

De repente seu Ser, foi soterrado. Seu brilho, seu entusiasmo, seu amor próprio foi destroçado porque você os ofereceu aos outros na esperança de que fosse vista e amada, para se sentir parte da família, para sentir importante pra alguém. 

E o que dói é se dar conta de que isso não irá vir de ninguém, ninguém vai bater na sua porta e dizer “olha só o que você ganhou por se anular”. Porque a gente não ganha nada se anulando, pelo contrário, apenas estamos dizendo ao mundo que não temos importância. Que suas vontades não importam, que seus desejos não valem nada, que seus sonhos podem esperar porque você precisa ajudar alguém primeiro. 

Te ensinaram que amor é sacrífico, que amor dói, mas não dói. O que dói é se destruir na esperança de que alguém te dê aquilo que só VOCÊ pode dar a si mesmo. 

O resultado disso tudo é desastroso, e não há culpado nenhum, nem você é culpada. Você apenas aprendeu que isso era amor, e talvez essa dor toda no seu peito seja sua alma te mostrando que esse não é o caminho. 

- Natália Mendes

Um dia as pessoas morem.na gente

UM DIA AS PESSOAS MORREM NA GENTE

É isto, nada além: um dia as pessoas morrem na gente. Pode ser um amigo que parece não se importar mais ou então aquele que telefona só quando quer ajuda, um amor que gastou todas as chances que tinha e nem toda dedicação do mundo comoveu, um primo de longe, qualquer um. Pode ser a criança que um dia morou dentro da gente, o sujeito que viajou pra longe sem dar adeus ou dizer que ia ou o visitante que chegou e nem ao menos um oi. Um dia as pessoas morrem na gente.  Pode ser um dia qualquer, como hoje ou ontem ou a terça passada, um dia de agosto ou no meio do carnaval, um dia de formatura ou até no ano novo, um dia de vento sul ou calor dos infernos, de vestido curto ou jeans surrado, de boca nervosa ou falta de apetite, de cabelo desgrenhado ou os cachos no lugar. Um dia as pessoas simplesmente morrem na gente, e a gente esquece as tardes divertidas que passou no boteco, a esperança que alimenta quando ainda não viveu muito, a promessa de nunca esquecer; a gente esquece que um dia quis ficar junto pra sempre, que jurou um monte de coisas. A gente faz força pra esquecer, porque sabe que precisa. É isto, nada além: um dia as pessoas morrem na gente, embora continuem vivinhas da silva. 
Ana Laura Nahas

Condição de entrega



Acaba de ser revelado o que uma mulher quer – e que Freud nunca descobriu. Ela quer uma relação amorosa equilibrada onde haja romance, surpresa, renovação, confiança, proteção e, sobretudo, condição de entrega. É com essa frase objetiva e certeira que Ney Amaral abre seu livro Cartas a Uma Mulher Carente, um texto suave que corria o risco de soar meio paternalista, como sugeria o título, mas não. É apenas suave.

Romance, surpresa e etecetera não chegam a ser novidade em termos de pré-requisitos para um amor ideal – supondo que amor ideal exista –, mas “condição de entrega” me fez erguer o músculo que fica bem em cima da sobrancelha, aquele que faz com que a gente ganhe um ar intrigado, como se tivesse escutado pela primeira vez algo que merece mais atenção.

Mesmo havendo amor e desejo, muitas relações não se sustentam, e fica a pergunta atazanando dentro: por quê? O casal se gosta tanto, o que os impede de manter uma relação estável, divertida e sem tanta neura?

Condição de entrega: se não existir, a relação tampouco existirá pra valer. Será apenas um simulacro, uma tentativa, uma insistência.

Essa condição de entrega vai além da confiança. Você pode ter certeza de que ele é uma pessoa honesta, de que falou a verdade sobre aquele sábado em que não atendeu ao telefone, de que ele realmente chegará na hora que combinou. Mas isso não é tudo. Pra ser mais incômoda: isso não é nada.

A condição de entrega se dá quando não há competitividade, quando o casal não disputa a razão, quando as conversas não têm como fim celebrar a vitória de um sobre o outro. A condição de entrega se dá quando ambos jogam no mesmo time, apenas com estilos diferentes. Um pode ser mais rápido, outro mais lento, um mais aberto, outro mais fechado: posições opostas, mas vestem a mesma camisa.

A condição de entrega se dá quando se sabe que não haverá julgamento sumário. Diga o que disser, o outro não usará suas palavras contra você. Ele pode não concordar com suas ideias, mas jamais desconfiará da sua integridade, não debochará da sua conduta e não rirá do que não for engraçado.

É quando você não precisa fingir que não pensa o que, no fundo, pensa. Nem fingir que não sente o que, na verdade, sente.

Havendo condição de entrega, então, a relação durará para sempre? Sei lá. Pode acabar. Talvez vá. Mas acabará porque o desejo minguou, o amor virou amizade, os dois se distanciaram, algo por aí. Enquanto juntos, houve entrega. Nenhum dos dois sonegou uma parte de si.

Quando não há condição de entrega, pode-se arrastar, prolongar, tentar um amor pra sempre. Mas era você mesmo que estava nessa relação?

Condição de entrega é dar um triplo mortal pressentindo que há uma rede lá embaixo, mesmo que saibamos que não existe rede pro amor. Mas intuir a presença dela nos basta.

Martha Medeiros

domingo, 12 de setembro de 2021

A fantasia de jogar tudo pro alto

A fantasia de jogar tudo para o alto

“Me chame de louca e me ganhe para sempre.” Tá, não é bem assim, mas parecido.

 Quanto mais cresce e se estabiliza a campanha pelo politicamente correto, mais as pessoas gostam de serem chamadas de loucas.

 Mulheres, quase todas. Principalmente as que não são.
Mulheres em geral são responsáveis, centradas, focadas, sabem bem o que querem e o que não querem: uma maneira de dominar a loucura intrínseca que as tenta.

 Ainda por cima, mulheres são mães, o que elimina de vez a chance de saírem da casinha (a não ser que a criatura seja louca MESMO). 

Todas carregam dentro o gene da insensatez, mas a maioria se controla, precisa amamentar de duas em duas horas, não esquecer de buscar as crianças no colégio, providenciar arroz e feijão à mesa todo dia, como despirocar?

Então elas abafam o desatino (aquele mesmo desatino que quem não se responsabiliza por ninguém extravasa) e ficam ali curtindo a fantasia da demência em silêncio, imaginando: “E se?”.
E se eu fizesse minha mala, dissesse bye-bye para a família e fosse passar um ano meditando na Índia?

E se eu fizesse minha mala, dissesse bye-bye para a família e fosse morar sozinha num quarto-e-sala no centro da cidade?

E se eu fizesse minha mala e aceitasse aquele emprego em São Paulo? E se eu fizesse minha mala e fosse cursar teatro em Nova York? E se eu fizesse minha mala e comprasse um sítio para ter a horta, o pomar e o jardim com que sempre sonhei? 

E se eu fizesse minha mala e me alistasse num projeto voluntário para finalmente dar um sentido a minha existência?

Tem sempre uma mala a ser feita no mundo das mulheres pseudoloucas.

Ou mais grave: um homem.
E se eu casar com ele mesmo ciente de que ele tem três ex-mulheres e oito filhos? 

E se eu fugir com esse desmiolado que só sabe tocar violão e mais nada? 

E se eu me arrepender de largar esse esquizoide que me fez mais feliz do que todos os homens sensatos que conheci?

Loucura e amor são parentes consanguíneos.
Quem olha de soslaio para uma mulher, jura que ela é confiável.

 Quase sempre é mesmo. Mas chame-a de louca, mesmo ela não sendo de fato, e terás uma mulher secretamente realizada em seus braços.

 Loucas, era tudo o que desejávamos ser, não fôssemos obrigadas a levar a vida tão a sério. Afinal, alguém tem que monitorar essa baderna aí fora.

Martha Medeiros.
Revista O Globo

O que vale realmente a pena

Somos frágeis.  Poeira à espera do sopro do vento.  Não temos tempo a perder.  Cada dia que a gente desperdiça é um sol que foi embora sem r...