Outro dia um jornalista me perguntou se eu achava que as pessoas andavam muito infelizes em suas vidas amorosas.
Eu não tenho procuração para responder pelos outros, mas acho que o termo “infeliz” é um pouco dramático. Conheço inúmeros casais que vão muito bem, obrigado.
O que existe hoje talvez seja uma angústia generalizada em razão da quantidade de portas que a liberação sexual nos ofertou.
Tem a porta A, que nos leva a um casamento monogâmico, a porta B que nos leva a um caso extraconjugal, a porta C que nos leva a uma vida de solteiro com inúmeros romances, a porta D que nos leva a uma bissexualidade ativa, a porta.
E que nos leva à paternidade, a porta F que nos leva à separação, a porta G que nos leva a uma solidão escolhida, a porta H que nos leva ao convento, a porta I que nos leva a um clube de swing, a porta J que nos leva a encontros virtuais, e as portas seguem se multiplicando nesse corredor de ofertas.
* * *
Antes a vida tinha menos opções. Você casava para sempre e constituía uma família, já que a reprodução era a razão de ser da sexualidade.
Ou então não casava e virava tia, uma mulher à margem, que não havia dado sorte, coitada.
Os homens tinham um pouco mais de liberdade, mas também acabavam aprisionados pela ética vigente: ou se transformavam em reprodutores e provedores, ou não eram boa coisa.
Depois que a pílula anticoncepcional entrou no mercado, sexo deixou de existir apenas para procriação e passou a existir pelo prazer.
E o prazer é múltiplo, advém de arranjos variados.
Mesmo ainda pressionados por alguns padrões, hoje temos mais informação e mais autonomia para bater à porta do estilo de vida que acreditamos que nos trará mais satisfação.
O problema é que esse prazer, que antes era facultativo, virou obrigatório. Ai de você se não tiver “x” parceiros no seu currículo, “n” orgasmos a cada transa, enfim, uma biografia de arrebentar.
Sua vida erótica tem que ser nada menos que inimitável. Ela passou a ser mais importante do que sua vida emocional, ao menos pra consumo externo.
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Deveriam andar juntos, amor e sexo. Isso restringiria o número de portas e, por consequência, a angústia de ter que escolher apenas uma e renunciar às outras.
Mas amor e sexo não andam mais juntos e as pessoas ficam perdidas, procurando um amor estável e ao mesmo tempo se abrindo para emoções efêmeras, tentando canalizar seu desejo e ao mesmo tempo sendo excitados por inúmeros estímulos que chegam da tevê, do cinema e das revistas.
Não creio que estejamos mais infelizes no amor, mas um pouco tontos, certamente.
Muitas possibilidades nos atraem e ao mesmo tempo nos paralisam. O que cada um de nós quer e precisa? Foco e autoconhecimento para transitar nesse freeshop erótico-afetivo sem virar refém do próprio deslumbre.
Jornal de Santa Catarina
13/09/2009 Martha Medeiros.
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